Carta Aberta ao Conselho Superior de Magistratura – da lapidação da mulher… “não honesta”

Efectivamente, não quis crer quando li apenas excertos do acórdão em assunto, pelo que me remeti ao silêncio. Entretanto, li-o integramente. Sou Advogado há mais de duas décadas e não vou recorrer à idiotice de me cindir, caso em que poderia dizer, “mas não é nessa qualidade que escrevo este texto”. Começo por dizer que sou homem, pai, filho, também sou advogado, e, pasmem, dou aulas numa universidade pública. Não me consigo dividir e dizer que parte da minha pele fica lá fora. Seria uma manha patética. Tenho plena consciência de que estou sob a alçada disciplinar da Ordem dos Advogados, e estou, assim como qualquer Cidadão sujeito às regras que emanam do Estado Direito Democrático. Ainda decidirei se formalizarei uma queixa junto do CSM. Em que moldes o farei e quando o farei. No entretanto, fica este texto, às cores.

Todo o texto integra o acórdão que foi proferido, pela Relação do Porto, no âmbito do âmbito do Processo n.° 355/15.2 GAFLG.P1 (link), em que foi relator o juiz desembargador Neto de Moura.

A verde as palavras da magistrada recorrente (MP), a vermelho as considerações tecidas no Acórdão que me remetem para 1886 e mais atrasado e que considero um verdadeiro pontapé no Estado de Direito Democrático, na dignidade das Mulheres e dos Homens. A azul e entre parênteses rectos, as minhas palavras, dúvidas e considerações.

«(…) A tese da senhora magistrada recorrente é a de que, tendo decorrido mais de quatro meses sobre a data em que o arguido X teve conhecimento do adultério da mulher, já ele não poderia estar “condicionado ou manietado e toldado por sentimentos de revolta e ciúmes, devido à traição”, antes agiu com total discernimento, planeando e premeditando a sua vingança.

O juízo efectuado pelo tribunal sobre o comportamento do arguido revelaria “inaceitável tolerância e até compreensão”, quando o que se impõe é uma condenação em severa e efectiva pena de prisão.

Salvo o devido respeito, uma tal apreciação afronta a razão e as regras da experiência.

É óbvio [é?] que, se o arguido foi internado devido ao seu estado de depressão, esta teria que ser profunda. Tal como é de primeira evidência que uma depressão não se cura de um dia para o outro.

Como bem refere o arguido X na sua resposta, não é preciso ser perito médico (basta ser sensato e objectivo) para se alcançar que uma depressão grave (tão grave que levou ao internamento numa instituição psiquiátrica) não se cura em dois dias, podendo prolongar-se por anos

[portanto, caro CSM, daqui a 20 anos, se esse tempo demorasse a depressão a curar, mantinha-se a ausência de premeditação invocada pela magistrada do MP?]

Ainda recentemente, a OMS chamou a atenção para esta doença que, em Portugal, afecta quase meio milhão de pessoas e é a principal causa de suicídio, requerendo um acompanhamento médico especializado e por um dilatado período de tempo. Não merece, pois, qualquer reparo (e, muito menos, a censura que lhe dirige a magistrada recorrente) o juízo probatório e valorativo efectuado pelo tribunal.

[a OMS… Bem, em face do que se segue, só se me afigura dizer que andou o juiz a ler modernices]

(…)  É inquestionável que a função de prevenção geral, que deve acentuar perante a comunidade o respeito e a confiança na validade das normas, tem de ser eminentemente assegurada.

No entanto, como já se deu a entender, não partilhamos da opinião da digna magistrada recorrente sobre a gravidade dos factos nem sobre a culpa dos arguidos, especialmente do arguido X.

Este caso está longe de ter a gravidade com que, geralmente, se apresentam os casos de maus tratos no quadro da violência doméstica.

[conceito vago e indeterminado, não assente em factos, meramente conclusivo e inócuo num Acórdão; mas é do tipo “gaja com sorte, pá, para o que fizeste levaste poucas”? É? É isso?]

Por outro lado, a conduta do arguido ocorreu num contexto de adultério praticado pela assistente.

[caro CSM, o facto de o relator repetir isso mil vez derroga as normas jurídicas vigentes?]

Ora, o adultério da mulher é um gravíssimo atentado à honra e dignidade do homem.

[ui. Ora diga lá…  e o adultério do homem? As regras de experiência comum do juiz são as suas regras de experiência comum? Ou da sociedade de XXI? Resposta lapidar já a seguir…]

Sociedades existem em que a mulher adúltera é alvo de lapidação até à morte.

[aguardo que o CSM se pronuncie sobre a aplicação (directa!)  de normas não jurídicas, estranhas ao Direito Português; quanto ao resto, retiro das palavras – retiro das palavras do juiz – que sorte tem “a gaja” em não viver numa dessas “Sociedades”; ou seria enterrada até ao pescoço e apedrejada até à morte.]

Na Bíblia, podemos ler que a mulher adúltera deve ser punida com a morte.

[aguardo que o CSM se pronuncie sobre a aplicação, ainda que indirecta, de uma leitura arrevesada de um texto religioso numa sociedade laica – no que me toca, embora já tenha lido a Bíblia, não costumo invocá-la em julgamento. Nem o Alcorão, a Torá, o Talmude, um Veda ou outro… doravante, posso?]

Ainda não foi há muito tempo que a lei penal (Código Penal de 1886, artigo 372.º) punia com uma pena pouco mais que simbólica o homem que, achando sua mulher em adultério, nesse acto a matasse.

[os artigos 381.º e seguintes do mesmo Código Penal previam a figura do “duelo”, atenuantes e agravantes. Posso invocar, caso me apeteça, o artigo 385.º desse “ora repristinado” Código? Caso eu mate alguém em duelo posso pedir um a dois anos de prisão? É que “Ainda não foi há muito tempo que a lei penal…” Foi só há 131 anos… E como ficamos, em 2017, em matéria de aplicação da lei no tempo? Posso ignorar o artigo 2.º do Código Penal. Invocar as Ordenações Afonsinas? São de só de 1446 e o V capítulo era dedicado ao Direito Penal, ou seja, “Ainda não foi há muito tempo que a lei penal…”. Posso?]

Com estas referências pretende-se, apenas, acentuar que o adultério da mulher é uma conduta que a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras) e por isso vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher.

[mulheres honestas versus mulheres adúlteras? E, CSM, como compreende o CSM a compreensão do juiz, perdão, a “alguma compreensão” com que este vê o exercício da violência pelo homem traído, no estrito contexto do Acórdão, sobre a mulher… “não honesta”?]

Foi a deslealdade e a imoralidade sexual da assistente

[em relação a esta infâmia, espero que o CSM tome as devidas providências; em que se traduz a imoralidade sexual da assistente? À luz do século XXI e à luz do artigo 2.º da CRP?]

que fez o arguido X cair em profunda depressão e foi nesse estado depressivo e toldado pela revolta que praticou o acto de agressão, como bem se considerou na sentença recorrida.

Por isso, pela acentuada diminuição da culpa e pelo arrependimento genuíno, podia ter sido ponderada uma atenuação especial da pena para o arguido X.

[em suma, se o arguido X tivesse recorrido, o que não fez, ainda veria a respectiva pena especialmente atenuada…]

As penas mostram-se ajustadas, na sua fixação, o tribunal respeitou os critérios legais e não há razão para temer a frustração das expectativas comunitárias na validade das normas violadas. (…)

Ora, a factualidade apurada permite caracterizar os arguidos como cidadãos fiéis ao direito, que têm tido um comportamento normativo e mostram-se perfeitamente integrados na sociedade.

Tudo indica que os actos praticados foram meramente ocasionais, que não repetirão.

[caso se repitam, poderão sempre invocar este acórdão, a Bíblia, o Código Penal de 1886, a lapidação em “algumas Sociedades” – um mundo inteiro de oportunidades, portanto]  

.Nenhum deles revela características desvaliosas da sua personalidade.

Ao contrário do que alega o recorrente, não há particulares exigências de prevenção especial que desaconselhem a suspensão da execução das penas de prisão.»

Rogério Costa Pereira

Fundão, 23 de Outubro de 2017

“Acusem-me, porra”

João Nabais, Advogado, a dar pérolas a porcos. Este processo já devia, tal como o meu Colega refere, ter sido dividido em dois, três, quatro, cinco… Os que fossem necessários. A pergunta “mas tu achas mesmo que ele é inocente?”. Francamente? Não me cabe a mim achar, cabe à Justiça julgar. A minha opinião sobre a culpa “dele” é irrelevante, absolutamente irrelevante. Tenho é a decência de assim a considerar, publicamente. Não acho nada, não nos movemos por “achismos”; vivemos num Estado de Direito Democrático com regras processuais que devem ser cumpridas.

Não se encerara um homem por dez meses com base em nada; e a prova de que era mesmo nada foi todo o tempo que decorreu desde então. Três ou quatro anos (ele saberá os dias e as horas). Com base em nada. Nada de suficiente que sustentasse uma acusação, pelo menos.

“Acusem-me, porra” é o mínimo que o Estado Direito deve cumprir com um Cidadão.

Sócrates esteve dez meses detido preventivamente; para que tal acontecesse havia (teria de haver) fundamentos sólidos (os tais indícios sérios de que fala João Nabais) para uma acusação. Assim não foi. Havia zero. Ou muito pouco, nada que sustentasse uma acusação que devia ter saído nos meses seguintes. Há mais factos? Venha outra acusação. Mais ainda? Outra acusação.

Se hoje há muito? Continuo sem saber. O que sei é que os prazos foram adiados sine die. Por causa de dois magistrados ineptos que mais não fizeram durante quatro anos do que alimentar a comunicação social, que diz saber de factos que a defesa ignora. E que aventa “verdades” que dificilmente passarão a mentiras. Responsabilidade zero.

Ter o correio da manha como interlocutor privilegiado do que se passa no processo é a prova de que batemos no fundo do fundo e, não contentes com isso, encontrámos uma porta e entrámos e continuámos a escavar. Tudo isto mete nojo e tudo isto é motivo de repulsa. O plural é meramente narrativo, não me incluo nele. Insisto que nada sei de Sócrates e de sua culpa ou inocência. Não posso concluir nada que não parta de decisões transitadas em julgado. Posso depois concordar ou não, mas isso é outra loiça. E certamente não opino assente em artigos de cornetas do diabo. Que vomitam o que a acusação lhes dá a mamar. Esse contrato entre o magistrado do mp e o correio da manha é a prova de que há muito para rever.

O “jornalismo” e as fontes. O “mp” e o “jornalismo”. E não rasguem as vestes, ó virgens. Censura é o que se passou até agora. Censura é este processo sem contraditório. Não falo de censura, falo de responsabilidade e de responsabilização. Não chega afastar o rosário teixeira do processo, há que investigar e responsabilizar os responsáveis por todas estas fugas diárias para os media.

Nada disto é novo, podemos recuar a Leonor Beleza, que soube pela comunicação social os termos da acusação. Proença de Carvalho, seu Advogado, teve de escrever um livro para poder defender a sua constituinte das atoardas de então. Sei que há cerca de vinte e um anos assentei o meu trabalho de agregação à Ordem do Advogados nesse assunto. Mantenho-me irredutível porque, porra, é-me tão óbvio. Não é pelos jornais. Melhor, a investigação jornalística pode espoletar processos; não pode é ser a voz do dono, que por sua vez também fica a parecer igual. E entre tantas vozes e tantos donos perde-se a Justiça.

Nunca ninguém saberá se Sócrates é culpado ou inocente. Agradeçam a quem diariamente vomitou manchetes para o correio da manha e para quem, “de referência”, lhes segue as patadas.

Lembram-se do caso Maddie? De como todos os dias havia uma conferência de imprensa onde “o tribunal” dava nota das evoluções? “Para inglês ver”, e nunca a expressão calhou tão bem. Mas por aí é o caminho. Já o era há vinte e um anos. O que vocês, jornalistas, podem dizer e saber é “isto”. Apenas isto. Se pisarem o risco estão a assaltar um tribunal; ainda que não partam vidros, ainda que não forcem portas. Se souberem mais do que isto, disserem mais do que isto estão a vilipendiar a Democracia.

Mas voltemos ao caso Sócrates. O tavares do Público já se dá ao luxo de pedir responsabilidades ao PS; já se dá ao luxo de explicar aos “pró-socráticos” o despacho da Procuradora Geral da República. Gostaria de pensar que são reminiscências do tempo em que foi recruta do correio da manha; ou de quando – antes disso – passou do zero ao cem por causa de um processo que Sócrates lhe moveu – e o tavares ganhou, e terá gostado de ver justiça feita (coisa que agora ousa fazer… à pata). Na verdade, tendo em conta os diários despautérios, resta-me achar que é a forma que o Público tem de ser… “plural” e de descer ao nível do microfone caído no fundo do lago (a mais bela jogada do Ronaldo).

Agora direi aquela coisa óbvia do “ponham-se no lugar dele”. É impossível. Este processo só ganhou os contornos que ganhou porque se trata dum ex-Primeiro Ministro. Naquele exacto lugar não é possível. Mas podemos adaptar as circunstâncias às realidades de cada um.

A instrumentalização da justiça pela comunicação social, com o poder político metido no meio a distribuir cartas é a negação da Democracia. Tudo serve para vilipendiar. Porque o sangue vende. E ganha-se dinheiro e ganha-se tempo e ganham-se razões. E quem duvida da culpa do homem, sujeito a tal ataque, em tantas frentes?

Mas ouve cá! Quando chegar o teu dia, quem duvida da tua culpa? Nasce connosco pararmos quando alguém tropeça numa pedra e se espatifa no passeio. Entre o riso e o acudir. Até aí percebo. Mas ouve cá! Quando chegar o teu dia, quem duvida da tua culpa? A galinha da vizinha que é mais gorda do que a minha e como raio ousou a minha vizinha? É isso? Tão só? Tão-só!

E concluo:

– Sócrates não me é indiferente. Já o achei solução (votei nele) e ao fim de seis meses arrependi-me. Mas não renego a minha responsabilidade que adveio de algo simples. Simples e grandioso. Simples levantar o cu do sofá; grandioso poder escolher, enorme poder errar. Este “poder dizer de nós” custou décadas de silêncio, de tortura e de morrer e de ir matar no ultramar. Não fiz o 25 de Abril, mas ninguém me impede de o continuar. O filho do Francisco Sousa Tavares, em crónica no Expresso, asseverou três vezes que não era por Sócrates. Ao contrário do pequeno miguel, não tenho de me justificar vez nenhuma. Ou talvez só uma. Não quero de volta os tribunais plenários, onde já ias de sentença lida.

– Fui votar, dizia (quem crê que “a abstenção é a solução” que funde uma igreja ou então olhe as recentes eleições na Holanda; 80% de “aqui estou eu” impediram a eleição de um fascista). Mas não é só essa a causa de não me ser indiferente. Dê por onde der, olhe-se por onde olhar, seja o resultado o que for, valerão sempre mais aquelas centenas de manchetes a dar o homem como culpado. Quais os crimes? Epá, isso não interessa. Inocente ou culpado, o grande rosário já disse e distribuiu a sua justiça. E, temam, é essa que vai valer. Sentenciados todos nós pelo correio da manha.

– A PGR deu uma no cravo e outra na ferradura. Tomem lá mais mês e meio e depois quero datas. Daquelas que marcam o fim. Uma acusação. Metem-se as férias de verão e lá para Outubro ou Novembro teremos a revelação-acusação. Acaso, entretanto, não surja mais uma ligação perigosa – vejam lá bem se o homem não andou a escutar o trump, o Obama e o putin ao mesmo tempo, qual agente triplo. Nessa altura teremos oportunidade de ver exactamente quais os indícios seriíssimos e gravíssimos que, naquela altura, levaram à prisão preventiva. Aposto singelo contra dobrado que o que consta do despacho que decidiu pela prisão preventiva será inócuo. Em face da acusação, entenda-se. Que será grandiosa, terá de o ser. E este ter de ser é tramado.

– Para terminar deixo uma certeza. Num processo destes, envolto em sigilo, é simples saber que soltou informação para os media. Basta olhar quem esteve presente e investigar. Tão simples assim? Como é que se sabe tanto (nada) cá fora do que foi dito lá dentro? Com o número limitado de pessoas que esteve presente em cada uma das diligências judiciais seria tão simples assim. Não perdendo de vista que apenas uma esteve presente em todas, a coisa resultaria ainda mais simples. Mas vade retro, que quem for por aí acaba detido preventivamente, não porque haja provas. Mas porque urge recolhê-las. Eu tenho de ter especial cuidado porque em 1984 olhei as torres gémeas. E, notem, dezassete anos depois aconteceu o que aconteceu. Não há coincidências, rosário. E, confesso, também já pisei a relva. Várias vezes. Várias relvas, de todas as cores, de várias formas. O que te facilita o estar é esta minha confissão.

– Sabem o que acho mesmo? Metade das pessoas que chegaram ao fim deste meu texto insistirão na pergunta: “Então achas mesmo que o gajo é inocente”? E isso é o que eu acho. Nada mais. Metade das pessoas que chegaram ao fim deste meu texto insistirão na pergunta: “Então achas mesmo que o gajo é inocente”? Não era esse o ponto. A questão é que a Justiça não é aquela menina ao lado do João Nabais.

Continuo a acreditar na Justiça, mas Justiça-mesmo. E a Justiça não é aquela coisa lá longe. Somos nós. Erra, pois erra. Erramos, claro que sim. Estas palavras acima representam o que penso da Justiça. Para que não haja MESMO confusões. Creio na Justiça. E todos podemos e devemos contribuir para ela. Uma coisa vos assevero, quando a entregarmos a máquinas, vamos todos dentro. No entretanto, há é que extirpar da Justiça o que não lhe pertence.

Este texto é a minha singela contribuição. Tenho andado engasgado, outras palavras se seguirão. Oxigénio.

Voto Elina Fraga​, obviamente!

elina-fraga

Por tudo o que fez pela Advocacia e pelo Estado de Direito Democrático; porque é urgente que o trabalho continue, que não é algo que se complete num mandato. Contra uma Advocacia de caciques (o amigo do amigo que pede ao amigo para votar no amigo). Contra o voto cego e empurrado pelo medo. Contra o “statu quo” de antanho que tenta fazer de nós soldadinhos de chumbo.

Sou Advogado, não sou marioneta de ninguém. Apesar de ter referido motivos “contra uma espécie de advocacia”, o meu voto é a favor… A favor da Bastonária Elina Fraga. O seu trabalho está à vista. Imagino que não seja (ainda) tão visível para quem não é Advogado, mas é por demais notório, para os Advogados, o que esta Bastonária fez pela Advocacia. Quem não vê (ou não quer ver) tem saudades do infame antigamente, onde os compadrios eram regra.

E “fazer pela Advocacia” é fazer pela Cidadania. Estas eleições não pretendem eleger o representante das “grandes” sociedades de advogados (com caves e porões de “advogados” a mudar nomes em minutas) e seus interesses

Voto numa Advogada, minha Colega. Uma Bastonária todo-o-terreno e que vai mesmo ao terreno.

Voto contra o anedotário que assevera que “os Advogados são todos iguais”. Não somos. Creiam, não somos. Mas não creiam apenas na minha palavra, só porque é a minha certeza. Procurem saber. Procurem destrinçar. Na verdade, e corrijo-me (ou não, apenas digo de outra forma), os Advogados são todos iguais. Urge é extirpar da função quem dela abusa.

E, já que voto, desta forma convicta, vai daqui também a minha esperança. Em forma de “exigência”.

Há que acabar de uma vez com a Advocacia “call center”. Há que “apertar a malha” e impedir e repudiar os advogados que não o são. E a cada dia que um advogado não o é, a Advocacia, injustamente, leva por tabela. Cada dia que um Advogado deixa de o ser, “eu” entro juntamente com ele naquele anedotário nacional. Cada dia em que um advogado ousa deixar de se exercer, todos os Advogados são golpeados. E a Advocacia. E a Justiça. E o Estado de Direito. E a Democracia. E os Cidadãos.

Após muita ponderação, votarei também em todos os demais candidatos (aos diversos órgãos) que acompanham a Bastonária Elina. Não o faço de forma cega e desembestada. E não o faço por fé, como quem crê no que não vê. Foram demasiados anos “daquilo”, e eu não concedo em deixar de ser Advogado. A actual Bastonária fez mais num mandato do que os três (quatro, cinco?) anteriores todos juntos, com todos os mandatos somados.

Ser Bastonário é, hoje por hoje, ser Elina Fraga.

Não é uma forma de auto-promoção. Não é um caminho aberto para o horário nobre nas televisões a comentar o caso do dia. E aqui, basta olhar o que foi. Se votei errado? Demasiadas vezes. Tantas que cobrei à actual Bastonária o meu voto… demasiadas vezes. E rocei mesmo a indelicadeza.

A verdade é que vinha demasiado queimado. Mas isso não calha aqui (mesmo porque já maldisse que chegue os meus passos errados; coisa que imagino arredia aos seres perfeitos).

O (meu) voto que contribuiu para o actual mandato não foi errado. Assim como este não o será. E se porventura vier a ser, no que não creio, aqui estarei. Como ora aqui estou.

Asinha termino. A Advocacia, mais do que a uma profissão, é um exercício de Cidadania.

Por isto e isso tudo, acima dito, voto Elina Fraga.

Artigo 297.º da Constituição: “Os magistrados guiam-se por umbigos; próprios ou alheios”

Onze meses cativo, sem culpa à vista, muito menos formada. Sem inquérito para acautelar. Detido preventivamente apenas porque “dois homens” assim o decidiram. Enxurdado num lamaçal jurídico que a nossa Constituição não acolhe. Não discuto culpas aquém do Estado de Direito Democrático. E se hoje está em liberdade foi porque dois Juízes Desembargadores acordaram, em Acórdão, que já bastava. É certo que não foram eles a razão processual da libertação (o Acórdão cuidava doutra questão); mas necessariamente foram eles os responsáveis pela razão constitucional e processual penal que levou ao fim da detenção. Fosse eu magistrado e levasse um responso processual de tal tamanho e faria por me rever. Mas à dupla alexandre & rosário nada disto assiste. É-me indiferente o destino do José Sócrates. Se condenado for, culpado será. Mas não pode ser um pequeno torquemada (cujas acusações caem em absolvições que nem tordos) e seu jic de serviço a decidir espetar com um fulano na cadeia apenas porque lhe cheira. E sem que os advogados saibam aquele pouco que o rosário lhes dita ou manda ditar nas manchetes da corneta do diabo dos tempos que correm.

Mais uma coisa. Se o caso tivesse a ver com submarinos e se as circunstâncias da magistrada ignomínia fossem as mesmas, as minhas palavras em nada seriam diferentes. A prisão preventiva ou a “prisão domiciliária” são a última razão útil para apurar razões. Não se prende um homem assim; por maioria de razão, quando a defesa sabe menos do que um pasquim a quem são debitadas “verdades” diariamente. Por onze meses.

E sabes que mais? Podias ser tu, acredita. Tu, eu, nós, vós; pobres diabos que ninguém conhece. Bastava um rosário ou uma rosária assim promoverem.

A ironia disto é que por causa da raiva babada pela acusação, e pelos muitos erros processuais que cometeu, o homem, culpado ou inocente, tem hoje um imenso e largo caminho directo e direito à absolvição.

O magistrado quer-se longe e largo de sentires pessoais e pegajosos. Tem os factos e a lei. Não lhe cabe cheirar culpas nem lamber inocências.

Felizmente, ainda há Procuradores e Juízes. Ainda há Mulheres e Homens que sabem que não se vai lá pelo cheiro, ó perdigueiro. Mas quando um tipo tem o azar de levar com um rosário de contas a ajustar agora… ‘tá fodido (pardon my french).

E preso estiveste (que interessa se preventivamente), culpado és. A grandessíssima merda é que isso cola-se-te à testa qual tatuagem. E ou mudas de país ou te atiras varanda acima. São apenas vidas que estão em jogo. Que raio interessa isso aos rosários e seus teixeiras? Guiam-se por umbigos, próprios ou alheios.

A Constituição da República Portuguesa tem apenas duzentos e noventa e seis (296) artigos.

Sócrates, as agendas, os calendários e as coincidências

Aquando da última revisão da medida de coacção, Sócrates recusou a prisão domiciliária com pulseira electrónica. No lugar dele, eu teria feito o mesmo.

No que respeita à questão do perigo de perturbação do inquérito, nada distingue aquela prisão domiciliária, que Sócrates rejeitou, da medida que ora lhe foi aplicada, prisão domiciliária sem pulseira electrónica, mas obviamente vigiada pelas autoridades.

Por outras palavras, do ponto de vista da salvaguarda do inquérito não há qualquer diferença, sendo que o arguido fica, num e noutro caso, impossibilitado de sair de casa.

Voltando à recusa de Sócrates em ser anilhado, direito que lhe assiste, não há razão processual para o juiz não o ter sujeito, há três meses, à medida que ora lhe aplicou.

No entanto, manteve-o na prisão.

Qual a razão? A mesma que leva os cães a lamber os tomates. Porque pode. Isto numa análise “benigna” da acção do juiz. Noutro tipo de análise, menos focada no umbigo do juiz, teria de falar em agendas e tempos de as folhear.

E é isto, e reitero que me encontro a léguas de distância de qualquer interesse no caso ou no arguido. Move-me o Direito e a Justiça.

Gostava apenas que o que leva aquele juiz a decidir neste ou naquele sentido, com este ou com outro arguido, fosse a Justiça. Porém, o homem acabou de provar, mais uma vez, que não é apenas isso que o move.

Digo mais uma vez, porque devo tomar em consideração que ricardo salgado esteve um ano em liberdade, sem esquecer que o papel arde a 233 graus Celsius, Fahrenheit 451; trezentos e sessenta e cinco dias por ano.  E que passado o ano, teve de imediato o que Sócrates só pode ter após nove meses de gaiola.

Ainda mais uma coisa; neste processo, salvo erro, o juiz tem cumprido ao dia os prazos de revisão das medida de coacção. Nada o impede de fazer antes, é certo. Mas dia 9 de Setembro (que seria o dia da revisão), António Costa debate com passos coelho. Não cabe a um juiz ponderar isso. A Justiça usa venda não por ser cega, mas para não olhar além do processo e dos sujeitos processuais.

De resto, não deixa de ser curioso o facto de todas as revisões da medida de coacção de Sócrates terem, até agora, batido certo com a agenda política. Com isto não quero significar que Sócrates é um preso político. Nem tampouco que o Tribunal é mais do que um mero instrumento de interesses alheios ao processo. Isto começou quando começou e tem tido a evolução que tem tido. Podia ter começado antes ou depois, mas “quase parece” que alguém escolheu aquele dia, e não outro, para dar início à parte mediática do processo.

E não, não contradigo o parágrafo anterior. É que daqui a 9 de Setembro, António Costa (em cujo partido não votarei) levará com cinco dias de jornalistas à porta de Sócrates. E, do ponto de vista político, isso será muito mais útil à “coligação” do que se a medida fosse revista no dia do debate.

Termino este desabafo, uma vez que falei em Sócrates, usando a forma que a comunicação social me ensinou ser a certa, sempre que se fala deste caso. Não vá alguém não saber.

“José Sócrates foi detido a 21 de novembro de 2014, no aeroporto de Lisboa, no âmbito da Operação Marquês”.

“O que é que Ricardo Salgado tem?”, Nicolau Santos

Finalmente, o Jornalismo saiu à rua e começou a questionar os x-actos de quem parece querer transformar a Justiça na sua negação. A Justiça não tem donos, em nenhum dos lados da bancada. A metafórica venda na estátua não é sinónimo de mercearia ou avença, mas de “faixa com que se cobrem os olhos”. Não para que não se destrince o certo do errado, mas precisamente para evitar uma Justiça para filhos e outra para enteados. Há que pôr parança a isto, sob pena de um dia vermos um qualquer clone do carlos alexandre a dirigir um tribunal plenário, esses infames alicates de justiça política do Estado Novo. Dito isto, segue-se o artigo de Nicolau Santos.
NS

(clique na imagem para ler o resto do artigo)

“(…) Mas o juiz Carlos Alexandre parece ser um semi-deus (…)”

Obviamente, passado um ano já se pode parecer ser sério. O estrago já está feito, a prova destruída, o inquérito perturbado. Mas não exageremos nas parecenças de seriedade. Nem preventiva, que realmente seria pateta nesta altura, nem pulseira electrónica, que é assim para o muito vista e pode assustar as visitas. Guardas à porta para o Dono Disto Tudo. E mais essa coisa do poder ir laurear a pevide com autorização do “meritíssimo”. Tudo, com os cumprimentos do Outro Dono Disto Tudo. Assim uma espécie de prisão relativa, que a Relação vai naturalmente mandar às malvas. E agora vou beber um café a Mação ou assim.

“Entretanto, Ricardo Salgado passa hoje a primeira segunda-feira da sua vida em prisão domiciliária, uma decisão do juiz Carlos Alexandre, justificada com os tradicionais perigo de fuga, perigo de perturbação de inquérito e da aquisição e conservação de prova. O Ministério Público tinha pedido apenas a proibição de se ausentar do país. Os motivos invocados por Carlos Alexandre para justificar a sua decisão causam enorme perplexidade a qualquer cidadão com um mínimo de inteligência, embora desprovido de quaisquer conhecimentos jurídicos: então durante um ano Ricardo Salgado não representou qualquer perigo de fuga, perigo de perturbação de inquérito e da aquisição e conservação de prova, andou sempre em liberdade e agora, de repente, pode fugir e perturbar o inquérito? Se quisesse fugir não o teria feito já antes? Se quisesse perturbar o inquérito não poderia tê-lo feito até agora? E que dizer da decisão de o manter em prisão domiciliária com dois polícias à porta em vez de se decidir pela utilização da pulseira eletrónica, que sai bem mais barata ao Estado (16 euros por dia contra 264 euros, ou seja, 480 euros por mês contra 8000 euros?). E não foi exatamente isto que recusou a José Sócrates, ou seja, regressar a casa sem pulseira eletrónica mas com polícia à porta?

A justiça tem certamente razões que a razão desconhece, mas há decisões que ultrapassam qualquer raciocínio minimamente coerente. E que deixam no ar a interrogação se não estaremos perante dois pesos e duas medidas. Mas o juiz Carlos Alexandre parece ser um semi-deus, que ninguém se atreve a questionar, nem mesmo quem tem essa obrigação.Nicolau Santos, in Expresso Curto.

Stewie Griffin e o interrogatório a Sócrates

stewieFoi o Stewie Griffin. Foi ele, sim, quem cedeu a transcrição do interrogatório a Sócrates à Sábado. Não pode ter sido o procurador e obviamente não pode ter sido o juiz. São magistrados, caramba. E os magistrados estão acima de todas as suspeitas. Nem sequer têm grupos no facebook dedicado ao tema “Vamos tramá-lo”. Quem ganha com mais este pontapé no Segredo de Justiça é claramente o Stewie. Se, entre quem tinha acesso à gravação [e Sócrates não tinha], para além dos magistrados acima de toda a suspeita, fizermos uma investigação [daquelas longas e intrincadas, afinal tanta gente tinha acesso a gravações a que só o Tribunal tinha acesso], chegamos de imediato ao Stewie. Por exclusão de partes, e porque quem de três tira dois… foi o Stewie. Rosemary’s baby!

Não li as transcrições da Sábado, mas do que fui lendo, aqui e ali, nota-se claramente que o procurador anda à pesca. E a indignação de Sócrates é mais que legítima. Novo aeroporto de Lisboa, Vale do Lobo, Duarte Lima, Quinta em Sintra. Tudo lhe foi atirado, sendo que o interrogatório tem um fio condutor que suplanta os melhores dias de Kafka.

“They’re talking about things of which they don’t have the slightest understanding, anyway. It’s only because of their stupidity that they’re able to be so sure of themselves.” ― Franz Kafka, The Trial

Só faltou mesmo [mas aguardemos novas revelações num qualquer pasquim] questionar o arguido acerca do seu papel na Extinção dos Dinossauros, nos Submarinos do Portas, no caso Watergate, na questão do Papel Comercial do GES e nos ET acidentados em Roswell. Ah, e já me esquecia: no “caso da venda da TAP” [o nome oficial da nascitura investigação deverá ser algo tipo “TAP 44 – Mayday”].

ADENDA: após ter lido o que a revista seleccionou do que lhe deram para seleccionar, mantenho o que disse no post. À pesca do procurador acrescento a do inspector da fazenda. Se provas houvesse, se tivessem documentos e o mínimo fio-condutor, já o teriam revelado. Um e outro assumem que escondem e escolhem mostrar o que bem entendem, na tentativa de que o arguido lhes faça ver a luz. Ignóbil, vergonhoso e a negação do que deve ser a realização da Justiça, assim como os meios para a descoberta da verdade material, num Estado de Direito Democrático. Isto não é um inquérito, é uma investigação por arrastão. Uma caça ao homem. Uma tortura. E nesta adenda não uso metáforas de espécie nenhuma.

Sócrates e as vítimas

"justice"Já não é do processo que se trata. Se é que algum dia de tal se tratou. Ou algum dia tratará. Acusam agora José Sócrates de se vitimizar, com a decisão que tomou ontem. Atrevam-se ao menos a pensar. O homem prescindiu de ir para casa, de estar com os filhos, de estar com a família e amigos. Ia anilhado, é certo. Mas ia.

Quantos de vocês trocariam essa possibilidade para não pactuar com o sistema (que de judicial nada tem) que o mantém há meio ano sem lhe dar a menor indicação concreta — mas concreta, mesmo! — de factos ou meros indícios culposos? Tudo o que se sabe tem sido criteriosamente seleccionado para dar ao correio da manha. Quem faz a selecção não é certamente a defesa. Restam, como suspeitos, a acusação e… a acusação. Ia dizer o procurador e o juiz, mas isso seria ridículo, de tal forma se confundem as posições.

Sócrates tem-se limitado a responder a perguntas, negando a “confissão” que outros já terão feito. A mensagem dele, de ontem, nada tem de ingénua, neste ponto. Encarceraram-no para torturar. Nada semelhante a investigar.

Sócrates não tem uma porra de um papel a dizer “acusação” em cima. Percebem? Nada. Zero. Vai defender-se das primeiras páginas de um jornal? Se são estranhos os não-factos referentes aos dinheiros que dizem que rolam e que dizem que pertencem ilegitimamente a Sócrates? Não faço a menor ideia. São não-factos. Se fossem factos já teríamos acusação pública.

Vitimização? A sério? Quantos dos que disso o acusam teriam tomates para serem tamanhas vítimas? Podridão. Acusem-no porra. Tenham ao menos essa decência. Se hoje alguém se vitimizou não foi certamente Sócrates.

Sócrates acusou. E essa é a única acusação que até hoje existe.