dr. Carlos & juiz Alexandre

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Vamos então começar pelo princípio. E para isso urge uma declaração de interesses e de desinteresses. Vamos por pontos. Depois o sumo.

  • A justiça não se pratica na comunicação social (há excepções, sim, mas que não acolhem o caso a que me refiro).
  • Um Juiz não dá entrevistas nem se pronuncia, ao de leve que seja, sobre casos que tem em mãos, tentando fazer prova da sua dignidade e aptidão.
  • Por igual razão (não maior, mas igual), o Juiz que tem em mãos a Operação Marquês não dá entrevistas. Ainda que não fale do caso, fala do caso, ao dizer do quão isento é. Do quão digno é. Quando assevera que as pessoas não o devem temer. Temo um Juiz que publicamente garante que não o devemos temer.
  • Nas últimas eleições em que Sócrates foi eleito, não só votei nele como fiz campanha por ele.
  • Hoje, e nada do que digo tem a ver com a actual situação do ex-PM, mais facilmente aceitaria uma injecção na testa do que votaria nele (é fácil apontar um erro, mais difícil é reconhecê-lo). Mas a minha questão é política, nada mais.
  • Apesar de o Sócrates ter sido melhor do que o que veio a seguir (seria uma impossibilidade material não o conseguir), não votei Sócrates nas eleições em que ele pôs o umbigo a votos.
  • E escuso-me de dizer das minhas razões para ter, então, votado diferente (certamente não no coelho). Não vem a propósito, e já gastei demasiados pontos com Sócrates (e apenas o fiz porque sei do que a casa gasta – este artigo é sobre um juiz, não sobre Sócrates).
  • É de Justiça que pretendo falar. Nada tem a ver com Sócrates. Tem tudo a ver com outro homem-umbigo. Por acaso, não fosse o acaso, têm jeitos de best friends forever.
  • Há aqui um pormenor curioso, e que me une ao Juiz Alexandre. Nem eu nem ele julgaremos a operação marquês. Eu porque sou Advogado. Ele porque escolheu ser o que é.
  • A latere, o juiz em título está a fazer um belíssimo trabalho, ele e o Procurador Teixeira, para que o Sócrates acabe absolvido. Tamanha a pesporrência processual. E isso também me aborrece.

Feito o sumário, vamos lá à matéria. À minha matéria, à minha opinião. A opinião de quem se subscreve, apenas. Não falo em nome de partidos. Não milito em nenhum, embora ultimamente tenha votado no Bloco. Não pertenço à Opus Dei nem à Maçonaria. Tendo em conta a forma como o juiz hoje se apresentou, é-me legítimo questionar se ele pode dizer o mesmo, é-me até legítimo apostar que ele não é maçon (posso, obviamente, saber mais do que pareço saber, ou até saber nada).

A partir do momento em que um Juiz – os media chamam-lhe super-juiz e não faço ideia se a questão lhe foi colocada, e se ele a refutou; que não sou adepto de pornografia judicial nos media (já me chega a “ao vivo”) – se expõe assim, eu ganho uma legitimidade que não tinha.

O meritíssimo passa a ser um homem que falou em público. Mais um. E desceu do estrado. Estamos agora à mesma altura (terá vexa minguado ou eu crescido). Bem-vindo à realidade. vexa colocou de lado a magistratura e resolveu guiar-se pelo enorme umbigo que ostenta. Não falando – e quero crer que não o fez – no caso que ora o faz rei, questiono. Tenho curiosidade, não sei se vexa esclareceu tal facto na entrevista, em saber se acaso recebeu autorização do Conselho Superior de Magistratura para esta novela em que hoje aceitou entrar. Às tantas, não é preciso. Mas coloco a questão por um motivo simples, não sei se enderece a queixa que amanhã mesmo farei ao Provedor de Justiça ou ao CSM ou a ambos. Por certo questionarei a Ordem dos Advogados (e valerá apenas como conselho) sobre o que hoje se passou.

Qual queixa? Não tens mesmo vergonha nenhuma, pá!  Até o juiz motoqueiro do processo casa pia conseguiu ser melhor. O que não faz de nenhum de vocês um juiz. Um Juiz, insisto, não aparece em horário nobre na televisão.  Os juízes não têm partido, não têm religião, não têm sexo, não têm cor, não pertencem à opus dei ou à maçonaria, não têm preferências sexuais. O homem por trás do juiz poderá ser e ter tudo isso. Será cristão, branco, macho, facho, usará cilício, será homofóbico (não isto, espero). Não são contas do meu rosário. A merda é quando eu sei de uma entrevista dada pelo Carlos Alexandre e sei (recebi um briefing, entretanto) que esteve ali um tipo que é juiz. E que felizmente julga a um nível intermédio. O que, lamentavelmente, chega para findar vidas.

Vamos lá então falar, de Advogado para isso que hoje vexa foi. Contar histórias. Não posso. Vês a diferença? Não devo. E nem quero. Acho que já passei a mensagem que queria passar. O que nos distingue, Carlos-homem, é que eu creio e luto pelo artigo segundo da nossa Constituição. A única ordem que me obriga, para além do fazer por ser um homem justo, é a Constituição.

Não sei se o Dr. Carlos ou o Juiz Alexandre podem dizer o mesmo. E a merda é essa, pá. Quem raio deu a entrevista? Foi o Juiz, o Dótor, o tipo da opus dei? Corre nos mentideros que és da opus. És? É que a partir de hoje, eu posso questionar isso. Ouvi dizer e não quero crer. O que se segue? O correio da manha? Uma entrevista à nova gente (nem sei se essa merda ainda existe).

Vexa abriu o flanco. E eu vou aproveitar. Sou Advogado, não só dos meus clientes. Mas também da res publica. E que pena não ter vexa levado o procurador Teixeira. Vexa lava, ele amacia.

Era só. E lembre-se, vexa. Um Juiz não dá entrevistas. Não pode. Um dia pode ter de julgar o entrevistador, percebe? Mas não é apenas por isso. E não, não vi a entrevista. Nem verei. Mas sei que a deu. Sei como foi anunciado. E sei quem vexa é.

Li agora que asseverou: “Não sou pessoa de quem ninguém deva ter medo. Tenho 1,69 metros no bilhete de identidade, agora estou um pouco mais magro.” Sério? Tem vexa noção da enormidade que as v/ palavras encerram? Estás mesmo a gozar o prato. Comigo e com a República. Vexa é um péssimo exemplo, sabe? E ainda ontem recebi um despacho que é a sua cara (e sim, segue mais uma queixa). E isso me dói.

Porque a Democracia e a República merecem Juízes. E o que vexa hoje fez é grave. Demasiado grave. E insisto. Não vi, nem verei a entrevista. Tamanha a gravidade. E ainda me custa a crer que a dita não seja produto da minha imaginação. Sabe como foi lida a coisa? O Juiz do Sócrates deu cabo do gajo. Acha vexa esta merda normal?

“Não tenho dinheiro ou contas bancárias em nome de amigos”? Li agora no DN que vexa vomitou tais palavras. Isso é coisa que um juiz diga num processo que está a julgar, ainda que em fase instrutória? Ou achas mesmo que o formalismo impede as gentes de perceberem de quem falas? O homem – e insisto nos pontos acima elencados; ou ainda me arranjam lugar no marquês – de quem falas é o homem que tens nas mãos (e essa acusação a duas mãos, sai ou não sai?). E isso não é bonito. E crê, umbigo, diria o mesmo se fosses tu o arguido.

Era só. Ganha vergonha. Que eu estou cheio dela, pelo que hoje fizeste. [este “tu” com que entremeei o meu texto? Não o confunda vexa, pois assim trato os meus amigos. É de nojo, mesmo, este “tu” de teclado].

Obviamente, amanhã farei tudo o que acima disse. Para que conste. E só mais uma coisa, vexa; a forma como aparece na imagem faz-me sorrir. E quiçá? Quiçá um dia o feitiço se vira contra o feiticeiro. E sou um crente no Estado de Direito Democrático. Apesar de vexa. Ou precisamente por causa de vexa.

Sócrates, as agendas, os calendários e as coincidências

Aquando da última revisão da medida de coacção, Sócrates recusou a prisão domiciliária com pulseira electrónica. No lugar dele, eu teria feito o mesmo.

No que respeita à questão do perigo de perturbação do inquérito, nada distingue aquela prisão domiciliária, que Sócrates rejeitou, da medida que ora lhe foi aplicada, prisão domiciliária sem pulseira electrónica, mas obviamente vigiada pelas autoridades.

Por outras palavras, do ponto de vista da salvaguarda do inquérito não há qualquer diferença, sendo que o arguido fica, num e noutro caso, impossibilitado de sair de casa.

Voltando à recusa de Sócrates em ser anilhado, direito que lhe assiste, não há razão processual para o juiz não o ter sujeito, há três meses, à medida que ora lhe aplicou.

No entanto, manteve-o na prisão.

Qual a razão? A mesma que leva os cães a lamber os tomates. Porque pode. Isto numa análise “benigna” da acção do juiz. Noutro tipo de análise, menos focada no umbigo do juiz, teria de falar em agendas e tempos de as folhear.

E é isto, e reitero que me encontro a léguas de distância de qualquer interesse no caso ou no arguido. Move-me o Direito e a Justiça.

Gostava apenas que o que leva aquele juiz a decidir neste ou naquele sentido, com este ou com outro arguido, fosse a Justiça. Porém, o homem acabou de provar, mais uma vez, que não é apenas isso que o move.

Digo mais uma vez, porque devo tomar em consideração que ricardo salgado esteve um ano em liberdade, sem esquecer que o papel arde a 233 graus Celsius, Fahrenheit 451; trezentos e sessenta e cinco dias por ano.  E que passado o ano, teve de imediato o que Sócrates só pode ter após nove meses de gaiola.

Ainda mais uma coisa; neste processo, salvo erro, o juiz tem cumprido ao dia os prazos de revisão das medida de coacção. Nada o impede de fazer antes, é certo. Mas dia 9 de Setembro (que seria o dia da revisão), António Costa debate com passos coelho. Não cabe a um juiz ponderar isso. A Justiça usa venda não por ser cega, mas para não olhar além do processo e dos sujeitos processuais.

De resto, não deixa de ser curioso o facto de todas as revisões da medida de coacção de Sócrates terem, até agora, batido certo com a agenda política. Com isto não quero significar que Sócrates é um preso político. Nem tampouco que o Tribunal é mais do que um mero instrumento de interesses alheios ao processo. Isto começou quando começou e tem tido a evolução que tem tido. Podia ter começado antes ou depois, mas “quase parece” que alguém escolheu aquele dia, e não outro, para dar início à parte mediática do processo.

E não, não contradigo o parágrafo anterior. É que daqui a 9 de Setembro, António Costa (em cujo partido não votarei) levará com cinco dias de jornalistas à porta de Sócrates. E, do ponto de vista político, isso será muito mais útil à “coligação” do que se a medida fosse revista no dia do debate.

Termino este desabafo, uma vez que falei em Sócrates, usando a forma que a comunicação social me ensinou ser a certa, sempre que se fala deste caso. Não vá alguém não saber.

“José Sócrates foi detido a 21 de novembro de 2014, no aeroporto de Lisboa, no âmbito da Operação Marquês”.

“O que é que Ricardo Salgado tem?”, Nicolau Santos

Finalmente, o Jornalismo saiu à rua e começou a questionar os x-actos de quem parece querer transformar a Justiça na sua negação. A Justiça não tem donos, em nenhum dos lados da bancada. A metafórica venda na estátua não é sinónimo de mercearia ou avença, mas de “faixa com que se cobrem os olhos”. Não para que não se destrince o certo do errado, mas precisamente para evitar uma Justiça para filhos e outra para enteados. Há que pôr parança a isto, sob pena de um dia vermos um qualquer clone do carlos alexandre a dirigir um tribunal plenário, esses infames alicates de justiça política do Estado Novo. Dito isto, segue-se o artigo de Nicolau Santos.
NS

(clique na imagem para ler o resto do artigo)

“(…) Mas o juiz Carlos Alexandre parece ser um semi-deus (…)”

Obviamente, passado um ano já se pode parecer ser sério. O estrago já está feito, a prova destruída, o inquérito perturbado. Mas não exageremos nas parecenças de seriedade. Nem preventiva, que realmente seria pateta nesta altura, nem pulseira electrónica, que é assim para o muito vista e pode assustar as visitas. Guardas à porta para o Dono Disto Tudo. E mais essa coisa do poder ir laurear a pevide com autorização do “meritíssimo”. Tudo, com os cumprimentos do Outro Dono Disto Tudo. Assim uma espécie de prisão relativa, que a Relação vai naturalmente mandar às malvas. E agora vou beber um café a Mação ou assim.

“Entretanto, Ricardo Salgado passa hoje a primeira segunda-feira da sua vida em prisão domiciliária, uma decisão do juiz Carlos Alexandre, justificada com os tradicionais perigo de fuga, perigo de perturbação de inquérito e da aquisição e conservação de prova. O Ministério Público tinha pedido apenas a proibição de se ausentar do país. Os motivos invocados por Carlos Alexandre para justificar a sua decisão causam enorme perplexidade a qualquer cidadão com um mínimo de inteligência, embora desprovido de quaisquer conhecimentos jurídicos: então durante um ano Ricardo Salgado não representou qualquer perigo de fuga, perigo de perturbação de inquérito e da aquisição e conservação de prova, andou sempre em liberdade e agora, de repente, pode fugir e perturbar o inquérito? Se quisesse fugir não o teria feito já antes? Se quisesse perturbar o inquérito não poderia tê-lo feito até agora? E que dizer da decisão de o manter em prisão domiciliária com dois polícias à porta em vez de se decidir pela utilização da pulseira eletrónica, que sai bem mais barata ao Estado (16 euros por dia contra 264 euros, ou seja, 480 euros por mês contra 8000 euros?). E não foi exatamente isto que recusou a José Sócrates, ou seja, regressar a casa sem pulseira eletrónica mas com polícia à porta?

A justiça tem certamente razões que a razão desconhece, mas há decisões que ultrapassam qualquer raciocínio minimamente coerente. E que deixam no ar a interrogação se não estaremos perante dois pesos e duas medidas. Mas o juiz Carlos Alexandre parece ser um semi-deus, que ninguém se atreve a questionar, nem mesmo quem tem essa obrigação.Nicolau Santos, in Expresso Curto.